sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Conspiração universal contra a minha pessoa

Há exatos 8 dias ameacei: "vou sair com trezentas pessoas a partir de hoje". Claro que foi um exagero, apenas quis dizer que ia deixar de me fechar para o mundo e tantar me interessar por alguém. No entanto, ainda não saí com uma pessoa sequer. E não foi por falta de tentativa.

Toda mulher tem um homem no stand by, que só é mantido nessa situação por ser absolutamente desinteressante - tão desinteressante, que os meses passam e ele continua solteiro. Tenho uma pessoa nessa condição, o Gabriel, com quem saí umas quatro ou cinco vezes. Nos primeiros encontros, não rolou nada, mas a certa altura comecei a ficar com pena e acabei beijando. Não foram mais que dois beijos, mas foi o suficiente para ele me dar uma caixa de ferrero rocher, um Cd gospel que nunca ouvi, falar de mim para a mãe dele e enviar torpedos apaixonados. A gota d'água foi quando entrei na internet e vi uma foto minha na janelinha do MSN dele. Imediatamente, esclareci a situação, disse que ele estava se precipitando e que não iríamos mais sair.

Embora eu não goste de homens atenciosos demais, não foi isso que me afastou dele. O problema é que a pessoa em questão tem uma enorme barriga, e barriga é coisa que só tolero em homens com mais de 40 anos. Tive várias crises de consciência, afinal, um ser humano não é só uma barriga e as pessoas valem por aquilo que têm dentro delas. A aparência não pode ser fator determinante para um julgamento. Senti-me preconceituosa e conversei com algumas pessoas. Todas disseram que não se tratava de preconceito, apenas de gosto pessoal. O fato é que eu jamais conseguiria transar com alguém com uma barriga enorme e, se os encontros continuassem, fatalmente chegaria a hora de transar.

Passou-se o tempo e eu voltei a ser amante do Alan. Mas, depois que eu mandei ele se fuder, tomar no cu e outros bichos, resolvi sair com esse cara mesmo. Desbloqueei Gabriel do MSN e sugeri que podíamos tomar um chopp, mas ele argumentou que estava sem dinheiro. Era uma indicação de que minha empreitada de sair com trezentas pessoas estava fadada ao fracasso.

Virei a página e resolvi fazer um perfil de orkut para galinhar. Mas só me apareceu gente chata. Depois, resolvi sair com alguém de fato atraente. O problema é que as pessoas que eu considero atraentes têm em média 17 anos e, portanto, são proibidas. Um deles, no entanto, deixou de ser proibido quando fez 18 anos. Conversei com ele sobre nosso "assunto pendente" - por "assunto pendente", entenda-se, um encontro que ele quis marcar mês passado e que eu declinei por ter vontado a me encontrar com Alan. Marcamos o encontro para terça-feira às 19h, ele me levaria ao apartamento que ele usa como "matadouro". Resultado? Às 19:20 ele ainda não havia aparecido no local combinado e eu voltei pra casa. Por sorte o local era muito próximo da minha casa e o encontro frustrado não me causou maiores transtornos.

A desculpa veio em seguida: ele acordou muito, muito doente. Mas, por que ele não me avisou que ia furar se tinha meu telefone, meu msn, meu email? Passadas algumas horas, comeceu a ficar com raiva, mas não desse guri, e sim do Alan. Por que absolutamente nenhuma das minhas tentativas de me desvencilhar emocionalmente deste homem que já é de outra dá certo??? É claro que eu não ia me apaixonar por um cara de 18 anos, mas o fato de transar com alguém que eu considero lindo pelo menos me distrairia um pouco. Não resta dúvidas: há uma conspiração universal contra a minha pessoa.

Bom, se nenhuma tentativa de sair com outra pessoa dá certo, deve haver uma explicação, daquelas de fundo espiritual, que põe a culpa no destino. Confesso que já pensei nisso, mas o pior é que nem isso é. Já consultei malandros, pomba-giras, baralho cigano, psicografias e sempre saí frustrada com as revelações que me foram feitas. A pior de todas foi quando um cigano de sotaque quase incompreensível me pediu para embaralhar as cartas e disse que eu ia começar a gostar do Mauro (aquele do estupro consentido por sete meses seguidos - veja arquivo do blog), que ele iria ficar muito tempo na minha vida e que eu iria ter filhos com ele. A minha cara de decepção ao ouvir isso deve ter sido interessante de se ver. Nem o mundo espiritual me dá esperanças de que eu e Alan podemos ficar juntos. Para evitar ouvir coisas desse tipo, fujo das religiões afro-brasileiras que nem o diabo foge da cruz. Agora, só vou à missa.

Afinal, o que a vida quer de mim? Por que só gosta de mim gente que eu não considero atraente? E por que só me interesso por pessoas de faixa etária comprometedora? Que conspiração é essa que existe contra mim? Qual é o caminho que me levará a esquecer o Alan de vez? Provavelmente, o da solidão. Humpff.

domingo, 23 de agosto de 2009

Em cara de homem não se bate!

Havia entre os dois um contraste flagrante e até espetacular. Rosinha, cheia de corpo, de vitalidade, com uma exuberância de modos e de palavras quase inconvenientes; Arturzinho, de uma polidez, de uma cerimônia que só vendo. Foi talvez a própria força do contraste que os aproximou. [...]

Dois dias depois, combinaram um cinema na sessão das seis. Acontece, porém, que quando ia saindo do Itamaraty, foi chamado ao gabinete do chefe. Demorou-se lá e, quando, por fim, apareceu na porta do cinema, Rosinha o esperava já há quarenta minutos, debaixo de chuva. A pequena fez um escândalo:

- Você fez comigo um papel de moleque. [...] Quer ver como lhe meto a mão na cara, aqui, na frente dessa gente toda?

Lívido, balbuciou: - “Quero”. Então, diante dos curiosos, que acompanhavam o incidente, Rosinha deu-lhe uma bofetada, uma bofetada de estalo, como no teatro. Em seguida, deixou-o plantado à boca da bilheteria e afastou-se, precipitadamente.

Chegando em casa, ela conta o episódio de rua. O pai, que acabara de chegar, passa-lhe um pito:

- Isso não se faz, não está direito. Vou te dizer uma coisa, minha filha: - na cara de homem não se bate! (Nelson Rodriges. Humilhação de homem. In: "A coroa de orquídeas e outos contos e A vida como ela é...")


Nada mais teatral do que uma mulher que vira a mão na cara de um homem em público. Lendo o conto acima transcrito, lembrei-me de dois momentos nos quais tive essa atitude. Acho que também houve um terceiro, mas não me lembro bem.

Aos 17 anos, em plena Quinta da Boa Vista, dei um super tapa na cara do Luís, que nem meu namorado era. Nós saíamos de vez em quando, sem regularidade nenhuma e, aos 22 anos, ele era o maior mulherengo que o céu cobria. Eu, totalmente imbecil, saída de um relacionamento sem graça, era completamente apaixonada por ele. "Vamos namorar, Lúis? " , eu sugeria; "Tá maluca, Milena?", ele respondia. Até que um dia, a verdade é dita sem máscaras: " Milena, você sabe que só fico com você por ficar, não sinto nada por você." Vem a reação: dou um tapa estalado no rosto dele, que não reaje, não esbraveja nem fica violento. Claro que ele censurou minha postura, mas isso não o impediu de dizer na despedida: " se quiser sair de novo, me liga."

O segundo tapa, como não podia deixar de ser, foi na cara do Alan. Era uma noite como as outras, ele voltava do trabalho e ia passar na minha casa. Telefonou pra dizer que estava a caminho e pediu que eu o encontrasse na rua. Atendi o pedido e o encontri na praça. Ele, carinhosíssimo, veio logo me beijar, o que não era do seu feitio. Muito teatral, Alan sempre vinha me ver com uma cara de sofrimento de quem carrega o mundo nas costas. Lamentava-se horrores de sua vida e só depois relaxava. Mas, naquela noite, ele vinha feliz e empolgado, porque Helena estava esquematizando uma ida ao teatro e ele queria que eu fosse junto com o grupo. Mudei imediatamente de humor, pois sofria de uma ciúme justificadíssimo daquela pessoa. Subimos a rua juntos e eu disse: "não vou a teatro nenhum com essa mulher". Ele, rebateu: "se você não for, também não vou". Aparentemente, o assunto morreu, mas não a minha cólera. Já sentados na portaria do meu prédio, a pretexto não sei de que, vem minha reação, presenciada por duas pessoas que passavam pela rua: um sonoro tapa na cara dele. Ele levanta, sente dor, não sabe o que fazer. Diz que se viesse mais um tapa na sequencia, ele cairia. Arrependo-me instantaneamente. Ele diz que vai embora, eu o seguro, com toda a fragilidade de uma pessoa de 50 kg e ele, inexplicavelmente, não se desvencilha e se deixa ficar. Vinga-se de mim em seguida: " Quer saber, tive um caso com a Helena sim, agora terminei e ela fica atrás de mim cobrando, você inclusive já presenciou algumas cenas." Fico totalmente atordoada: "Mas como, se você sempre disse que fui sua primeira amante? Seu mentiroso desgraçado!" Ele, então, tenta consertar: "É mentira, só falei isso pra te fazer sofrer e me vingar do que você fez. Nunca tive caso nenhum com a Helena, olha bem pra mim e vê se tenho cara de ter um caso com a Helena!"

Já sem me importar muito com a verdade, vou com a Alan para a garagem. Começa uma briga, a pretexto de um dilema no trabalho. Ele começa a se expressar aos brados, que são ouvidos por todo o prédio. Triunfante, vira as costas e vai embora.

Subo e mal entro em casa, vem minha mãe brigar: "O que esse cara estava gritando? Na garage, ainda por cima! Já não falei que não quero vocês dois na garagem?" Explico partes da situação e falo do tapa. Tudo muda, e a raiva da minha mãe, que se pudesse faria Alan sumir da face da Terra, se transforma em uma leve simpatia. E a frase que ela me diz é a mesma dita pelo personagem de Nelson Rodrigues: "Milena, em cara de homem não se bate! Você tá louca? O cara já é todo problemático e você faz isso?" A culpa, que já me devorava, invade as profundezas do meu ser.
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Voltando ao texto de Nelson Rodrigues, eis a reação de Arturzinho após ser agredido na porta no cinema:

No dia seguinte, pela manhã, bate o telefone. Era Arturzinho. Antes de dizer “bom dia”, começa:
- Meu bem, estou telefonando para te pedir desculpas.
Era demais. Rosinha pula:
- Como pedir desculpas? Você apanha na cara e ainda pede desculpas?
Ele gagueja:
- Eu te fiz esperar, e...
Rosinha corta novamente: “Pelo amor de Deus, Arturzinho! Não me peça desculpas. Sou eu que vou te pedir, eu! Andei mal, mas você pode ficar certo de que nunca mais, ouviu?” Do outro lado da linha, o pobre-diabo insiste: - “Quer dizer que você não está mais zangada?” Rosinha perdeu a paciência:
- Quem deve estar zangado é você, e não eu!


Que reação se deve esperar de um homem que apanha na cara? No mínimo, que se chateie muitíssimo. Se a reação de Arturzinho causa surpresa e vai contra a ideia de que em cara de homem não se bate, eu garanto que a reação do Alan foi mais rodrigueana que a dos próprios personagens de Nelson.

Primeiro, Alan se surpreende e finge tentar ir embora; depois, faz uma revelação bombástica, para em seguida desmentir; a vingança parece pouca e, não se dando por satisfeito, grita pra dar vazão à raiva; por fim, tem uma saída teatral.

Mas, isso não é tudo. Na mesma noite, conversamos pela internet e eu não sabia o que fazer para ele me desculpar. Ele responde: "quem disse que tô chateado? pelo contrário, me senti mais teu depois daquele tapa." No encontro seguinte, ele vai além: "se dentro de três dias não tiver outro tapa daquele, tá tudo acabado entre a gente."

Até hoje, quando ele apronta das suas e depois reconhece a besteira que fez, ele pede: "anda, me dá um tapa, eu mereço porque te maltratei". Eu, naturalmente, me recuso. Quando está empolgado, pensando em sexo, ele diz: "quero apanhar de você, na cara."

Agora me digam, quem é mais rodrigueano? Os personagens Arturzinho e Rosinha, criados pelo próprio Nelson, ou duas figuras da vida real, Milena e Alan? Este é sem dúvida um dos casos em que a realidade parece mais ficcional que a própria ficção.

sábado, 22 de agosto de 2009

"Ele não gosta de você!"

"Milena, ele não gosta de você." Quantas vezes Aline me disse essa frase? Uma, talvez duas vezes. Isso foi em 2004, se não me engano. E até hoje não esqueço essas palavras.

Minha amizade com Aline surgiu do nada, na aula de Teoria da Literatura. Eu já fazia faculdade, mas resolvi começar uma segunda, por puro lazer. E assim, auxiliada pelas constantes greves nas universidades públicas, comecei a faculdade de Letras à noite, sem que a jornada dupla jamais me atrapalhasse.

Aline, por alguma dessas razões difíceis de compreender, recusava-se terminantemente a comprar livros de ficção. O professor havia exigido a turma a leitura de "A mentira", de Nelson Rodrigues e eu fiquei radiante, pois naquela época já havia lido alguma coisa de Nelson e jamais tinha ouvido falar no livro "A mentira". Comprei o livro, li com rapidez, reli e sublinhei várias passagens. Era a primeira aula que Aline assistia e, mesmo sem nunca ter me visto, puxou assunto e pediu meu livro emprestado.. Esquecendo completamente a máxima que diz que "quando alguém empresta umlivro há dois idiotas: o que empresta e o que devolve", confiei naquela completa desconhecida. Ela não só me devolveu o livro como ainda pediu ajuda para fazer o trabalho. Daí surgiu uma grande, embora efêmera, amizade. Impossível não amar alguém que te devolve um livro e ainda troca ideias sobre a leitura depois.

Embora eu estivesse totalmente desgostosa da faculdade que fazia de manhã, sempre tive a certeza que não seguiria nenhuma carreira relacionada a Letras. De manhã, eu frequentava as aulas com uma preguiça impressionante, chegava atrasadíssima sem cerimônia nenhuma, em certo período cheguei ao cúmulo de fazer apenas 3 matérias, obtendo um rendimento medíocre. Ainda assim, não estaca disposta a largar esse curso que tanto me aborrecia. A faculdade de Letras era lazer, a outra era obrigação. Como para compensar o balde que eu não tinha coragem de chutar de manhã, chutei o balde à noite: fiz um período apenas e larguei a faculdade de Letras, sem nem me dar ao trabalho de trancar a matrícula. Depois, me arrependi, e com uma facilidade impressionante, quase sem burocracia, reabri a matrícula. Reencontrei a Aline no corredor e a amizade foi reatada prontamente, embora não fizéssemos mais matérias juntas. Já as outras pessoas, que antes eram do meu gripo, tornaram-se completas desconhecidas. Fiz mais um período, comecei o terceiro e sumi novamente. A amizade com Aline acabou ali, apesar de alguns telefonemas meus que ela jamais retornou. Desisti de tentar contato, mas sinto muito sua falta.

Certa vez, ocorre a tragédia: André termina tudo comigo. E por um daqueles motivos que seria preferível não saber: se apaixonara por outra. Eu, que sequer havia percebido qualquer mudança em seu comportamento, fiquei abaladíssima. Tanta dedicação para nada! Quantas vezes deixei de lado minhasobrigações para ajudá-lo a estudar para o vestibular, quanto do meu tempo empreguei procurando questões de todas as disciplinas para ajudá-lo! Mas, como veio o fracasso, meu esforço foi facilmente esquecido. O desempenho dele foi tão pífio que nem na faculdade particular mais vagabunda ele poderia entrar. "Me deidquei tanto para levar um pé na bunda", era só o que eu conseguia pensar. Hoje, entendo perfeitamente a situação, ela não era obrigado a ficar comigo apenas por gratidão.

Mas, naquela época, tudo que eu não consegui ser foi uma pessoa centrada. Bolava as estratégias mais absurdas para André voltar comigo. Como a menina pela qual ele estava apaixonado o dispensou sem dó nem piedade, achei que era questão de tempo voltarmos a namorar. Mas tudo que eu conseguia com minhas tentativas de reaproximação era irritá-lo. E foi no momento em que descrevi uma das grosserias de André que Aline disse: "Milena, ele não gosta de você!"

Do alto de sua autoridade de quem vivia um namoro feliz e sem sobressaltos, Aline estava certíssima. André reatou comigo depois de alguns meses e, passada a euforia inicial, eu mesma fui aos poucos percebendo que nada tínhamos a verum com o outro. Depois de dois anos eu mesma terminei, sem que ele esboçasse qualquer protesto. Hoje, não resta qualquer tipo de afeição entre nós, nem amizade.

Se Aline ainda fosse minha amiga, o que ela diria sobre Alan? A mesmíssima coisa que dizia sobre André: "Milena, ele não gosta de você". Cada vez que Alan apronta das suas, só consigo me lembrar dessa frase. Talvez, com uma correção: "Milena, ele não gosta de você e tão pouco você dele. O que existe é obsessão. Você não aceita é ser rejeitada."

sexta-feira, 21 de agosto de 2009

Pelo buraco da fechadura: o fascínio de Nelson Rodrigues

Ah... meus 21 anos... eu frequentava a faculdade (que na época odiava) e vivia com um livro de ficção debaixo do braço. Não, eu não fazia "leitura axilar", como meu professor orientador descreveu, a título de brincadeira, a postura de um aluno que andava pra cima e pra baixo com um livro, sem jamais abri-lo. Eu lia mesmo, e nenhuma das leituras era condizente com o curso que eu fazia. Na verdade, não é que não fossem condizentes, pois qualquer leitura sempre nos enriquece, mas os textos acadêmicos que eu xerocava sempre mereceram menos atenção que a ficção. Houve uma fase em que me fascinei por Lima Barreto; em outro momento, inspirada pelo samba da Unidos da Tijuca de 2001, intitulado "A Unidos da Tijuca apresenta Nelson Rodrigues pelo buraco da fechadura", cismei que era um absurdo jamais ter lido nada de tão conhecido escritor. E, por sorte, algo se comemorava em relação a ele e a Companhia das Letras estava lançando inúmeros textos de Nelson, com capas belíssimas. Sim, sou o tipo de leitora que adora uma bela capa. Certa vez, pedi para o meu pai comprar um livro do Graciliano Ramos e destaquei: "compra o da capa mais bonita", pois na época a editora Record estava lançando edições bem caprichadas das obras de Graciliano. Não adiantou nada o aviso e meu pai veio com uma capa bem acabadinha, o que me fez pensar que ele recorreu a algum sebo para adquirir o livro "Insônia". Em 2007, quando fui à bienal do livro com a minha amiga, sempre que eu me deparava com um livro que eu já tinha, comentava: "eu tenho, mas a minha capa é mais bonita"; ou, então, me lamentava: "aaaahhh! essa capa é mais bonita do que a da minha edição!"

Não sei precisar se aos 21 anos eu lia Nelson Rodrigues com uma ótica muito diferente da que leio hoje. Mas, uma coisa eu lembro: naquela época, jamais dei uma risada lendo os contos de "A vida como ela é". Hoje, eu simplesmente morro de rir de algumas cenas. Uma coisa que adoro é quando, antes de descrever algo inusitado, o narrador diz: "certa vez, foi até interessante" - que humor pode existir em uma expressão como essa, não sei, é coisa do meu cérebro.

Outro aspecto que me chama atenção é a teatralidade absurda que Nelson coloca em seus textos. Seus personagens quase sempre apresentam reações exageradas, entram em desespero, pensam em meter uma bala na cabeça, em matar alguém, se expressam aos brados, abusam das interjeições. Isso dá uma certa comicidade às tramas, pelo menos na minha ótica.Há também oscilações, sem lugar para meio-termo. Ou seus personagens vivem lutos severíssimos diante de algum falecimento ou ignoram por completo a situação, considerando que aquela morte veio a calhar, tomando-a como ponto de partida para a felicidade.

Outra coisa que adoro são as expressões que aparecem nos textos de Nelson: "é espeto!", "ora pipocas!" ,"que mágica besta!", "natural!", "dinheiro, mulher e outros bichos", "é golpe!" , "sacode o braço até as nuvens", "bate o telefone", "vamos e venhamos", "compreendeu?", "batata!", "você iria num lugar assim, assim...", "temia mais o jugamento da vizinha do que o juízo final", "que esperança!" , "caiu das nuvens"... são tantas as expressões que nem sei qual é a minha preferida.

No próximo post, sem qualquer intenção de imitar o misnovels.blogspot.com, pretendo analisar um ou outro conto de "A vida como ela é". Afinal, quase todos são condizentes com o tema desse blog.

quarta-feira, 19 de agosto de 2009

Decepção de número 31.456.789



Quantas vezes uma pessoa pode nos decepcionar? Até 7 vezes? Não, muito mais do que isso, tem gente que é capaz de nos decepcionar 70 vezes 7. Desculpe parafrasear a bíblia em um blog que versa basicamente sobre a prática do adultério, mas cada vez que me decepciono só consigo me lembrar dessa passagem do evangelho. Na verdade, a passagem em questão diz que devemos perdoar 70 vezes 7; logo, deduzo que se eu continuo me decepcionando com a mesma pessoa, apesar de todos os absurdos que ela já fez, é sinal que perdoei todas as mancadas anteriores, pois cada novo fato me choca como se os anteriores não tivessem existido. Pois bem, quem sabe essa minha capacidade absurda de perdoar não me garanta uma vaguinha fora do inferno?

A última decepção foi ontem, em uma conversa de internet. Sempre tivemos uma relação super aberta, onde tudo é permitido, onde podemos falar as coisas mais loucas que passam pela nossa cabeça com a certeza de que o outro não se choca com nada. Mas, ultimamente, esse tipo de relação não está servindo mais pra mim. Uma coisa que me irrita é quando ele fala de outras mulheres, que fulana é gostosa, que fulana é maravilhosa, que não-sei-quem que estava no metrô tem uma bunda enorme... porra, pra que me falar isso? Se o objetivo é me irritar, parabéns, porque ele consegue. Nunca tive a pretensão que meus namorados fossem cegos para a beleza de outras mulheres, mas uma coisa é admirar e fantasiar, a outra é me contar.

Outra mania irritante do Alan é me rifar. Não foram poucas as vezes que ele quis me jogar para outros homens, mas ontem isso atingiu as raias do absurdo. Temos um conhecido em comum, adolescente, meio maluquinho, evangélico fanático e chato pra cacete, mas Alan simplesmente adora esse cara. Uma das maiores distrações do Alan é ficar debochando da cara desse garoto porque ele é virgem. Ontem, Alan sugeriu que eu poderia tirar a virgindade dele e perguntou quanto eu cobraria. Resolvi dar corda e disse que cobraria 350 reais. Alan falou que me daria 500 e disse que ia querer assistir.

Não brigamos imediatamente, mas fiquei bem aborrecida. Depois, o assunto mudou para nossos gostos musicais, e eu comentei de funk, pagode e mpb - ritmos que o Alan não curte, pois só gosta de música internacional. Ele começou a falar que odiava funk e eu disse: "eu gosto de funk mesmo e foda-se quem não gosta". Ele ficou puto da vida e saiu intempestivamente da internet. Mas, como ele está com o péssimo costume de entrar invisível, eu não sabia se ele estava realmente off ou se ainda estava lá.

Nossa, eu fiquei com uma sensação péssima após a conversa, fiquei com muita raiva e ao mesmo tempo triste pela forma que ele me trata. No fundo, ele me vê como uma subclasse de pessoa que não merece respeito, em uma categoria abaixo da prostituta. Não é porque não me envergonho dos meus desejos e tenho desenvoltura para lidar com o sexo oposto que mereço ser desvalorizada. Chorei, fiquei nervosa, quase tive um treco, não consegui dormir, enfim, tive uma reação que daria inveja às reações que Nelson Rodrigues imaginava para seus personagens de "A vida como ela é". Mandei um email super agressivo, já que ele estava off e eu precisava esculhambar com ele de alguma forma. Eis o conteúdo:

"Alan, tô muito decepcionada com vc, é incrível como entre nós dois é sempre a mesma coisa que se repete: num dia estamos bem, no outro vc me deixa puta. Quer saber, certo estava o ---- que falou que vc não me leva a sério. Cansei disso. Ainda me deixa falando sozinha na porra da internet. Vai tomar no cu e esquece que eu existo. Vou sair com trezentas pessoas a partir de hoje, não é possível que nenhum deles me ineteresse de alguma forma. Cansei de me fechar pro mundo por sua causa. Você não merece um pingo da minha consideração. Vai se fuder."

Gente, desculpe, mas estou desbocada mesmo. Tem horas que só asssim conseguimos desabafar.

quarta-feira, 5 de agosto de 2009

Confusão de sentimentos 2


Parece irônico que a vida mude tão rapidamente. Ontem mesmo eu estava feliz, apesar de ter um relacionamento meio torto, senti que realmente estava bem e perfeitamente adaptada à realidade possível de ser vivida. Mas de uma hora para outra, tudo mudou.

E o pior é que não sei o que mudou. É estranho, mas o período diurno é difícil pra mim. Não me sinto bem, o dia se arrasta sem que eu faça nada de útil e quando converso com ele à tarde não é a mesma coisa. Não sei precisar há quanto tempo comecei a funcionar melhor à noite, mas só depois das 18h começo a me animar, estudo e consigo produzir. Não é à toa que optei por trabalhar à noite. E é à noite também que bate a saudade e que sinto necessidade de conversar com ele. Mas à tarde, não é assim.

Alan tem dois empregos e às vezes consegue usar a internet no trabalho. Ele tem me avisado um dia antes que estará on line por volta das 15h e, seu eu estiver em casa, fico on line também. Ele não muda seu comportamento, continua falando as mesmas bobagens e às vezes até algo de útil, ele continua carinhoso igualzinho ele é á noite. Mas eu, sei lá, não sei o que sinto quando converso com ele à tarde. Depois que a conversa termina, fico me culpando por não ter sido carinhosa. Da última vez que isso aconteceu, mandei um email todo fofinho para compensar minha indiferença. Dessa vez, pensei em fazer o mesmo, mas não fiz. E o pior que tudo isso é coisa da minha cabeça, ele nem deve mais estar lembrando disso, para ele, foi uma conversa como as aoutras.

Fiquei pensando: será que o amo mesmo? será que só estou nessa por orgulho e desejo de disputá-lo com a esposa? o que de fato eu sinto por ele? Quando o vejo, não tenho dúvidas de que o amo muito, basta olhar pro rostinho dele e já fico toda derretida. Mas quando estou longe, não sei mais. Talvez meu sentimento seja vício e não amor. Ou talvez as duas coisas.

Na tentativa de colocar meus sentimentos em ordem, pensei em ficar ausente da internet por uns dias, até ter minha consulta sábado com a psicóloga (sim, eu faço terapia). Mas não sei se vou conseguir. Sempre fica aquela necessidade de dizer a ele alguma coisa. Quando não queremos mais alguma coisa, basta tomarmos a atitude. Se não queremos mais falar com a pessoa via MSN, basta não falar e pronto. Mas meu cérebro doentio tem a necessidade de dizer: "olha só, a partir de hoje não falaremos mais no MSN." Atitude ridícula, pois entrar no MSN pra dizer que não se pretende mais falar no MSN já denuncia que nossa intenção não é verdadeira. Ao dizer isso a alguém, estamos esperando que a pessoa negocie e nos faça desistir da decisão. Meu amigo passou por uma situação semelhante quando sua ficante ligou pra dizer que eles não podiam mais falar ao telefone. Oras, eu uso o telefone pra dizer a alguém que não podemos mais falar ao telefone ... Não seria mais lógico simplesmente não ligar mais? É óbvio que essa menina voltou a ligar pra ele. Sua decisão não era verdadeira.

Tudo isso me faz lembrar a passagem de um livro, que diz: "Já que me faz mal, nunca mais hei de fumar, mas antes disso quero fazê-lo pela última vez." (Italo Svevo. A consciência de Zeno, p. 12) Zeno não quer realmente se livrar do cigarro, pois se quisesse simplesmente jogava o maço fora e pronto, mesmo que no dia seguinte ele não suportasse a abstinência e comprasse outro. Mas, para se livrar do vício, ele sente que precisa exprimentá-lo ainda uma vez - e logicamente, nunca é a última vez. Essa atitude do personagem-narrador é muito semelhante à minha: não quero mais falar com ele pela internet, mas entro na internet "pela última vez"; mão quero mais encontrá-lo, mas preciso ir ao encontro, nem que seja para dizer isso ... e assim, o relacionamento já se arrasta por dois anos, já terminamos umas 3.567.892 vezes, mas se hoje decidimos que vamos nos afastar, amanhã já estamos conversando novamente. E assim, nunca sou levada a sério, cada vez que digo que vou me afastar ele diz: "vamos ver por quanto tempo". Minhas palavras não tem mais credibilidade.

Chegou a hora da atitude. Simplesmente não entrar mais no MSN e pronto. Sumir, nem que seja por uns 3, 4 dias (sim, temos que estabelecer metas possíveis de serem cumpridas, nada de sumir pra sempre, pois é impossível nesse momento). Mas o fato é que preciso agir sem dar maiores explicações. Será que vou conseguir? Ou melhor, será que realmente estou dispota a tentar?

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Toda amante é infeliz?

É lugar-comum imaginar que toda amante é infeliz. E, de fato, a maioria que está nessa situação se lamenta com pequenas coisas, sofrendo por não poder telefonar a hora que bem entender e se torturando ao imaginar o dia-a-dia de casado de seu amor. Sem medo de errar, posso dizer: não sou infeliz por estar nessa situação.

Meu relacionamento tem uma dinâmica bem peculiar. Há meses abolimos os telefonemas e não sentimos a menor falta disso. Nosso contato se dá unicamente via internet e está de bom tamanho. Também já me habituei ao jeito dele, que de vez em quando some por 4 dias, às vezes uma semana, mas depois reaparece como se a ausência não tivesse existido. Os sumiços já me fizeram sofrer, mas hoje, não mais.

Algumas amantes se lamentam por não poder tornar o relacionamento público, mas isso também não me faz falta. Ao menos semanalmente, temos nos encontrado e sempre vamos embora de mãos dadas. Só não me esqueço totalmente que o relacionamento é clandestino porque tenho pavor da esposa dele.

Quanto a imaginar seu dia-a-dia de casado, isso também não me incomoda. Sequer me torturo imaginando que ele transa com a esposa. Como todo homem casado que arranja namoradinha fora de casa, ele diz que não mantém mais relações sexuais com ela. Há pouco tempo ele me disse: "Você não vai ficar chateada? A última vez que transei com ela foi no carnaval." Por que ficaria chateada? Se ele é casado, tem que transar com ela, oras!

Tenho um amigo que diz que eu preciso resolver essa situação. Mas que situação existe para ser resolvida? Tudo está muito bem arrumado: ele fala comigo todo dia, me trata bem, é carinhoso (embora ele tire alguns dias para me irritar), me vê com certa frequencia. O que mais posso querer? Ele volta pra casa e não sofro com isso; eu paro numa cafeteria pra comer bolo, faço escova, chego em casa e vou cuidar das minhas leituras. Após o encontro, a vida de cada um segue na mais perfeita paz. Garanto que minha situação está melhor do que muito namoro por aí. Seu eu fosse a titular, talvez não estivesse tão feliz, pois já o conheço e sei que ele não gosta de ir ao cinema, de sair pra comer uma pizza, de tomar sorvete... ele gosta de ficar o tempo todo dentro de casa. Eu seria uma namorada muito irritada cobrando sempre uma atitude que ele não é capaz de tomar. Como amante, não pressiono em nada e não incomodo sua vida com cobranças.

Enfim, não tem nada pra ser resolvido. Está tudo ótimo assim.

PS: Sim, eu e Alan voltamos a nos ver. Já faz algumas semanas que nossos contatos deixaram de ser apenas virtuais. Teria o nome do blog "Amores desfeitos" ficado inadequado? Talvez apenas temporariamente...